sexta-feira, 12 de março de 2010

O Principezinho

- «Cativar» quer dizer o quê?
- É uma coisa de que toda a gente se esqueceu - disse a raposa. - Quer dizer «criar laços»...
- Criar laços?
- Sim, laços - disse a raposa. - Ora vê: por enquanto tu não és para mim senão um rapazinho perfeitamente igual a cem mil outros rapazinhos. E eu não não preciso de ti. E tu também não precisas de mim. Por enquanto eu não sou para ti senão uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativares, passamos a precisar um do outro. Passas a ser único no mundo para mim. E eu também passo a ser única no mundo para ti...
- Parece-me que estou a perceber - disse o principezinho (...)
- Tenho uma vida terrivelmente monótona. (...) Mas, se tu me cativares, a minha vida fica cheia de sol. Fico a conhecer uns passos diferentes de todos os outros passos. Os outros passos fazem-me fugir para debaixo da terra. Os teus hão-de chamar-me para fora da toca, como uma música. E depois, repara! Estás a ver aqueles campos de trigo ali adiante? Eu não gosto de pão e, por isso, o trigo não me serve para nada. Os campos de trigo não me fazem lembrar nada. E é uma triste coisa! Mas os teus cabelos são da cor do ouro. Então, quando tu me tiveres cativado, vai ser maravilhoso! O trigo é dourado e há-de fazer-me lembrar de ti. E hei-de gostar do som do vento a bater no trigo. (...) Se queres um amigo, cativa-me!
- E tenho de fazer o quê? - disse o principezinho.
- Tens de ter muita paciência. Primeiro, sentas-te longe de mim, assim, na relva. Eu olho para ti pelo canto do olho e tu não dizes nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas podes-te sentar cada dia um bocadinho mais perto...
O prnipezinho voltou no dia seguinte.
- Era melhor teres vindo à mesma hora - disse a raposa. - Por exemplo, se vieres às quatro horas, às três, já eu começo a estar feliz. E quanto mais perto for da hora, mais feliz me sinto. Ás quarto em ponto hei-de estar toda agitada e toda inquieta: fico a conhecer o preço da felicidade! mas se chegares a uma hora qualquer, eu nunca vou saber a que horas hei-de começar a arranjar o meu coração, a vesti-lo, pô-lo bonito... Precisamos de rituais.
E o principezinho cativou a raposa. Mas quando se aproximou a hora da despedida:
(...)
- Adeus...
- Adeus - despediu-se a raposa. - Agora vou-te contar o tal segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos...
- Os homens já não se lembram desta verdade - disse a raposa. - Mas tu não te deves esquecer dela. Ficas responsável para todo o sempre por aquilo que cativaste.

[Antoine de Saint-Exupéry - O Principezinho]


... só porque alguns se esqueceram, e outros... outros nunca irão aprender...

Nenhum comentário:

Postar um comentário

a tua opinião é importante, obrigada